sábado, 30 de março de 2013

Música na literatura # 13

«No mesmo instante, os acordes majestosos e solenes da "Música da Água", de Handel, desceram tremulamente a escada, vindos do quarto de Sofia. E, muito abafada, ouvi uma gargalhada de Nathan.»
in A escolha de Sofia, de William Styron, pg. 90

«Mas, sem que o soubesse, devia estar aberta e receptiva aos poderes miraculosamente terapêuticos do Dr. W.A.Mozart, pois as primeiras frases da música - a grande "Sinfonia Concertante" em mi bemol maior - fizeram-na tremer toda, invadida por um prazer simples e sem complicações. E, de súbito, compreendeu por que motivo isso acontecia, por que motivo aquela música sonora e nobre tão cheia de peculiares e arrepiantes dissonâncias lhe inundava o espírito de alívio, reconhecimento e alegria. É que, para além da sua beleza intrínseca, tratava-se de uma obra cuja própria identidade ela procurara durante dez anos. A peça musical quase a enlouquecera quando o conjunto de Viena visitara Cracóvia cerca de uma ano antes do Anschluss. Sentada na sala dos concertos, escutara a obra fresca e nova como que em transe, com as janelas e as portas do seu espírito escancaradas para deixarem entrar as harmonias exuberantes, entrelaçadas e variadas e as loucas dissonâncias inexaurivelmente inspiradas. Numa época da sua juventude toda feita de descoberta perpétua de tesouros musicais, aquele foi um tesouro novinho em folha e supremo. No entanto, nunca mais voltara a ouvir a peça, pois, como tudo o mais, a Sinfonia Concertante e Mozart, e o lamentoso e doce diálogo entre violino e viola, flautas e cordas e metais tristes, tinham sido arrastados pelo vento da guerra numa Polónia tão árida, tão asfixiada pelo mal e pela destruição, que a própria ideia da música era uma excrescência grotesca.»
in A escolha de Sofia, de William Styron, pg. 140

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